Por que o Estado Islâmico ainda continua sendo uma ameaça 5 anos após ter sido derrotado

Forças iraquianas avançando em Mossul em 16 de abril de 2017, durante uma ofensiva para retomar a cidade do controle do Estado Islâmico.




Forças iraquianas avançando em Mossul em 16 de abril de 2017, durante uma ofensiva para retomar a cidade do controle do Estado Islâmico.

Foto: Getty Images / BBC News Brasil

As autoridades austríacas anunciaram a prisão de duas pessoas, no dia 7 de agosto, por planejarem ataques a grandes eventos em Viena, incluindo shows da cantora Taylor Swift. Os suspeitos — um rapaz de 19 anos, conhecido pelos serviços de segurança, e um jovem de 17 anos — são cidadãos austríacos que acredita-se terem sido radicalizados pela propaganda extremista islâmica do grupo autoproclamado Estado Islâmico (EI) e da Al-Qaeda.

Estes planos frustrados foram seguidos por um ataque com faca na cidade de Solingen, no oeste da Alemanha, em 23 de agosto, que matou três pessoas e feriu outras oito. O EI assumiu a responsabilidade pelo ataque no dia seguinte.

Para entender a mensagem que o Estado Islâmico pretendia enviar por meio destes ataques, precisamos levar em consideração como o grupo operou tanto em seu auge quanto após sua derrota em 2019, quando o último território controlado pelo grupo foi liberado em Baghuz, na Síria.

Entre 2014 e 2016, o EI ganhou destaque na imprensa internacional por sua campanha para estabelecer o chamado califado islâmico no Iraque e na Síria. O grupo recrutou homens e mulheres de mais de 80 países e cometeu atrocidades contra minorias, incluindo curdos, shabaks, cristãos e yazidis nos territórios do Iraque e da Síria que ficaram sob seu controle.

Uma coalizão global composta por 87 parceiros internacionais, incluindo países e associações como a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), foi estabelecida para derrotar o EI. Depois que o grupo perdeu o controle de todo seu território, houve uma redução significativa da atenção da imprensa. Este declínio na cobertura ocorreu apesar das consequências duradouras e graves das ações do grupo, particularmente para grupos étnicos, como os yazidis.

Dez anos se passaram desde a brutal campanha de genocídio e escravidão sexual do EI contra os yazidis no Iraque. Mas cerca de 150 mil sobreviventes ainda vivem em tendas de acampamentos para pessoas desalojadas, e aproximadamente 2,6 mil yazidis ainda estão desaparecidos.

A perda de território físico foi um golpe decisivo para a imagem do EI como uma entidade extensa e poderosa. No entanto, suas capacidades ideológicas e operacionais estavam longe de serem erradicadas.

Notável capacidade de adaptação

O Estado Islâmico demonstrou uma capacidade notável para se adaptar e persistir. O grupo fez a transição de uma estrutura territorial centralizada para uma rede mais clandestina de células descentralizadas operando principalmente na África Subsaariana, ainda capaz de orquestrar e inspirar ataques em todo o mundo.

Alguns destes ataques foram extremamente notórios. Em 2021, grupos afiliados ao EI lançaram um ataque à prisão de Al-Sina, na Síria, para libertar outros militantes.

A batalha que se seguiu com as Forças Democráticas Sírias (uma milícia no nordeste do país liderada por curdos apoiados pelos EUA) durou dez dias — e deixou mais de 500 mortos. Não há consenso sobre o número de membros do EI que conseguiram escapar da prisão, mas acredita-se que esteja entre 30 e 300.

Depois, em março de 2024, o braço do grupo no centro-sul da Ásia, o Estado Islâmico-Khorasan, atacou a casa de shows Crocus City Hall em Moscou, na Rússia. Este incidente destacou a capacidade do EI de atacar muito além do Oriente Médio.

O EI pode parecer menos ameaçador agora do que em seu apogeu. Mas estes e outros ataques servem como duros lembretes de que, apesar da perda de seu califado, o grupo continua sendo uma forte ameaça que busca continuamente projetar poder e espalhar medo pelo mundo.



Ataque a casa de shows em Moscou deixou 145 mortos e 551 feridos em março

Ataque a casa de shows em Moscou deixou 145 mortos e 551 feridos em março

Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Os ataques frustrados aos shows de Taylor Swift nos dizem várias coisas. Primeiro, que o EI ainda é capaz de planejar ataques em qualquer lugar, muitas vezes usando pessoas radicalizadas localmente, sem enviar membros para o exterior. Isso indica que a ideologia do grupo continua viva — e que os jovens ainda são vulneráveis às suas narrativas extremistas violentas.

Em segundo lugar, a escolha dos shows de Swift foi estratégica. Um ataque a um evento com tanta visibilidade teria atraído uma atenção significativa da imprensa internacional, o que poderia ajudar no recrutamento. Na verdade, o grupo pode já ter alcançado parte do seu objetivo — ganhar atenção da mídia — simplesmente planejando o ataque.

E terceiro, vale a pena considerar o possível elemento misógino dos ataques planejados. Semelhante ao atentado a bomba em um show de Ariana Grande, em Manchester, em 2017, este ataque foi planejado contra uma cantora cujos shows são predominantemente frequentados por meninas e mulheres jovens.

Estes incidentes destacam a ordem política e social extremamente patriarcal promovida pelo EI, que dita os papéis e posições de mulheres e homens dentro do grupo. Esta ideologia de gênero tem motivado a violência, e servido como um meio de promover sua agenda brutal, desde que o EI surgiu em 2014.

Combatendo a ameaça

Viena já sofreu com terrorismo antes — a cidade enfrentou um ataque, em 2020, que matou quatro pessoas. Mas os recentes ataques frustrados destacam problemas em curso de radicalização online e offline, que se manifestam em várias ideologias e crenças.

As pessoas que são suscetíveis à radicalização não estão restritas a uma faixa etária específica. Embora os jovens sejam frequentemente citados como quem corre particularmente risco, pessoas de todas as idades podem ser vulneráveis a influências extremistas, motivadas por uma série de fatores pessoais, sociais, políticos e ideológicos.

Os Estados não podem se dar ao luxo de se tornarem complacentes, apesar da derrota territorial do Estado Islâmico — ou de qualquer grupo terrorista. Eles devem continuar a se concentrar nas pessoas vulneráveis à radicalização, sem estigmatização.

* Busra Nisa Sarac é professora de estudos sobre terrorismo na Universidade de Portsmouth, no Reino Unido.

Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado aqui sob uma licença Creative Commons. Leia aqui a versão original (em inglês).

Fonte: Terra

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