Orçamento subestima gasto com Previdência e receitas são incertas

Especialistas em contas públicas desconfiam do Ploa quanto ao cumprimento da meta de zerar o deficit em 2025

O Ploa (Projeto de Lei Orçamentária Anual) de 2025 encaminhado pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Congresso foi criticado por especialistas em contas públicas. Do lado das receitas, a equipe econômica superestimou os valores e recorreu ao Congresso para aumentar tributos. Já os gastos com a Previdência Social estão subestimados em R$ 20 bilhões, segundo cálculo economista-chefe da ARX Investimentos, Gabriel Leal de Barros.

O ajuste fiscal Lula tem tido um lado prioritário: o aumento de arrecadação. As despesas –em especial as obrigatórias– seguem em crescimento constante e sem perspectivas de revisão. O pente-fino em programas sociais anunciado em agosto é visto como uma medida que tem pouco impacto. Não há propostas do governo para frear de forma estrutural os gastos.

A insistência em aprovar medidas que aumentam a receita expõe a “fadiga” do Congresso com o Executivo, disse Leal de Barros. O economista indica que a estratégia de aumentar a arrecadação via Congresso ter se exaurido.

“[O Orçamento] Vem com várias premissas heroicas pelo lado da arrecadação e do gasto. Pelo lado do gasto, o grande destaque é a Previdência, que está, pelo menos, R$ 20 bilhões subestimada”, declarou o economista. O governo estimou a despesa em R$ 1,007 trilhão (leia mais abaixo).

O economista declarou que a equipe econômica está utilizando uma premissa de crescimento vegetativo baixo dos benefícios previdenciários.

Para Leal de Barros, o envio do Ploa 2025 foi “protocolar” e “para inglês ver”. Avalia que, durante a tramitação, o projeto sofrerá alterações.

“[O Orçamento de 2025] Não é sólido e nem crível. […] Continuamos com problemas no arcabouço fiscal por conta das inconsistências matemáticas que existem no próprio arcabouço. O Orçamento de 2025 nasce com o mesmo problema, que certamente será ajustado no meio do caminho”, disse o economista.

RECEITA SUPERESTIMADAS

A equipe econômica está mais otimista que os analistas do mercado financeiro em relação ao crescimento econômico de 2025. Enquanto o Boletim Focus indica uma alta de 1,85% no PIB (Produto Interno Bruto), o Ploa 2025 enviado ao Congresso estima uma alta de 2,64%.

A projeção mais alta eleva as expectativas de recolhimento de impostos e, consequentemente, a receita esperada. Uma eventual frustração na atividade econômica poderá resultar em revisões e bloqueios dos gastos discricionários, como bolsas de pesquisa científica, Farmácia Popular e outros.

Se for 1 ponto [percentual] a menos de PIB [em 2025] tem R$ 15 bilhões a menos de receita recorrente”, disse Leal de Barros.

O economista disse que o governo “insiste” em estimar um volume de receitas extraordinárias, assim como em 2024. As medidas que estão aprovadas e com expectativa de receita extraordinária somam R$ 121,5 bilhões. A estimativa é:

  • retomada do voto de qualidade do Carf – R$ 28,6 bilhões;
  • transações de processos de contencioso – R$ 57,5 bilhões;
  • recuperação créditos inscritos na Dívida Ativa da União – R$ 15,5 bilhões;
  • controle especial na utilização de benefícios tributários – R$ 20,0 bilhões.

O governo federal espera ainda a aprovação do Legislativo de aprovações de projetos no Congresso que têm efeito estimado de R$ 46,7 bilhões na arrecadação. Leia quais são abaixo:

  • compensação da desoneração da folha de pagamentos – R$ 25,8 bilhões;
  • aumento da cobrança sobre os JCP (Juros sobre Capital Próprio) – R$ 6,0 bilhões;
  • aumento da alíquota da CSLL (Contribuição Social sobre Lucro Líquido) – R$ 14,9 bilhões.

O Congresso não dá sinais de que vai aprovar essas medidas. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), disse, em 31 de agosto, que a aprovação é “quase impossível”. O economista-chefe da ARX Investimentos avalia que, desde que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), devolveu a medida provisória de créditos tributários, há uma “fadiga” por parte do Congresso por continuar “aumentando impostos”.

Leal de Barros defende que houve um sinal bem forte do Legislativo. “[Sinal de] Chega. Não dá mais para fazer o ajuste [fiscal] só pelo lado da receita”, disse. Ele disse que o voto de qualidade do Carf não resultou em “um centavo” para o governo em 2024 e a equipe econômica estima arrecadar R$ 28,6 bilhões em 2025.

O economista declarou que as frustrações de receitas extraordinárias (como o Carf) em 2024 têm sido parcialmente compensadas com as receitas recorrentes –pelo crescimento econômico– e o maior pagamento de dividendos.

“Para o ano que vem, eu acho que não vai dar para conseguir fechar essa conta. Sem malabarismo e criatividade contábil, o governo vai ficar meio de lado. Um dado neste ano [2024] de 0,6% ou 0,7% do PIB e ano que vem a mesma coisa”, declarou Leal de Barros.

O economista-chefe da Warren Investimentos, Felipe Salto, disse, em relatório, que, apesar da meta de zerar o deficit o Orçamento de 2025 indica que haverá um saldo negativo de R$ 40,4 bilhões nas contas públicas. O motivo é o pagamento de R$ 44,1 bilhões em precatórios que estão fora das regras fiscais.

Segundo o economista, o cumprimento da meta dependerá de receitas “incertas”. E completou: [Receitas] das quais a meta fiscal anual não poderá prescindir para ser cumprida, mesmo com o mencionado abatimento de precatórios”, declarou Salto.

O economista disse que o Ploa confirma o quadro fiscal “bastante desafiador” e que será “muito difícil para o governo diminuir o déficit público entre 2024 e 2025”. Salto avalia que há um número “elevado de receitas atípicas” que são condicionadas à aprovação do Congresso ou “simplesmente incertas”.

O estrategista-chefe da corretora Monte Bravo, Luciano Costa, avalia que ainda é incerto se o governo conseguirá aprovar todas as medidas legislativas necessárias para deixar as contas em um saldo neutro. A subestimação das despesas também preocupam. Se for maior que o esperado, será necessário arrecadar ou cortar gastos para compensar. 

“A meta de deficit zero é crível? Não na nossa visão. Achamos que vai haver uma certa dificuldade exatamente de cumprir esse ganho de arrecadação que o governo está esperando”, declarou Luciano ao Poder360.

PREVIDÊNCIA SOCIAL

O Poder360 mostrou neste sábado (7.set.2024) que a Previdência custará R$ 1 trilhão aos cofres públicos em 2025 e há expectativa que a população idosa se iguale ao número de pessoas que contribuem para a Previdência em 2025.

Rogério Nagamine Costanzi, pesquisador do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), disse que quanto mais tempo adiar uma nova reforma da Previdência maior vai ser o “estrago nas contas públicas”.

“Se não fizer nada, a dívida pública tende a crescer de forma insustentável. […] Mais de 90% dos gastos são obrigatórios”, declarou Nagamine.

Com exceção do pagamento de juros e amortização da dívida, que não estão sujeitos a tetos, a Previdência Social representa a maior cifra de gastos da União. Ao considerar somente as despesas sujeitas ao teto de gastos estabelecido no marco fiscal, os benefícios previdenciários custarão R$ 998,1 bilhões em 2025. O valor corresponde a 49,4% de todas as despesas obrigatórias do governo.

Há ainda uma análise de que as despesas previdenciárias possam estar abaixo do que deverá efetivamente ser pago em 2025. Luciano Costa afirma que o governo subestimou esses gastos também em outros anos.

“No que se refere à parte de pessoal e Previdência, tem uma subestimativa […] Já não é a 1ª vez que o governo tem feito isso. No Orçamento deste ano também houve uma subestimação dessas receitas”, declarou o especialista ao Poder360

Ele afirma que haverá um aumento das dotações para os encargos com pessoal até o fechamento do Orçamento no fim de 2024, quando a peça será aprovada pelo Congresso depois de sofrer modificações.

“O governo tem ao longo do ano uma expectativa de contratação e às vezes a despesa com pessoal acaba ficando subestimada”, disse.

Ao incluir gastos que estão livres das regras do teto do marco fiscal, o volume de gastos com benefícios previdenciários aumenta para R$ 1,007 trilhão. O gasto cresceu 9,1% em relação a 2024.

Leia abaixo a trajetória das despesas com benefícios previdenciários desde 2013:

ORÇAMENTO 2025

O Ploa estabelece um crescimento de 6,8% de 2024 para 2025 nas despesas que estão sujeitas ao teto de gastos do marco fiscal. A regra aprovada em 2023 define que o avanço dos gastos não poderá ser maior que 2,5% acima da inflação. Também tem como indexador o aumento de até 70% do crescimento real das receitas nos 12 meses terminados em junho do ano anterior.

Portanto, definiu-se que os gastos sujeitos ao limite do marco fiscal serão de R$ 2,249 trilhões. O valor é R$ 143,9 bilhões a mais que a previsão mais recente de 2024.

O orçamento brasileiro é engessado, segundo analistas. Significa dizer que há pouca maleabilidade nas despesas. De cada R$ 10 que são gastos, R$ 9 são obrigatórios. Dos R$ 2,249 trilhões, mais de R$ 2 trilhões são custeios que não são passivos de cortes.

Uma outra forma de mostrar que as despesas obrigatórias tomam conta de quase totalizada do que é gasto pela União é a composição do aumento de R$ 143,9 bilhões em gastos em 2025. Na prática, quase 92% são em pagamentos obrigatórios. O governo federal só tem o controle sobre R$ 11,7 bilhões.

A equipe econômica discute propostas para diminuir a proporção das despesas obrigatórias no Orçamento 2025. A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, citou um aperto no Simples Nacional, a restrição do abono salarial só para quem recebe 1 salário mínimo e a diminuição dos subsídios tributários para 2% do PIB (Produto Interno Bruto).

O governo Lula ainda não apresentou ideias concretas para reduzir as despesas. Além do tema ser impopular para a sociedade, o período eleitoral dificulta o andamento dessas propostas no Congresso.


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Fonte: Poder 360

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