Opinião | A federação de contas

Prédio do TCU

Legislação não determina, de maneira clara, a ascensão de integrantes de tribunais estaduais e municipais ao TCU

O Brasil, como sabemos, é uma república federativa. Muito já se disse sobre a relação necessária entre o princípio republicano e a função de controle, exercida pelo Poder Legislativo e pelos TCs (Tribunais de Contas). Pouco se discute, entretanto, acerca da posição dessas Cortes no contexto da federação. 

Diferentemente dos tribunais judiciais, que organicamente constituem um sistema de caráter nacional, com instâncias recursais e provimentos verticais a perpassar os entes federativos, os 33 órgãos de controle espraiados nos 3 níveis ainda carecem de mais “vasos comunicantes”, embora venha crescendo sua atuação concatenada.

A Constituição de 1988 assegura aos ministros do TCU (Tribunal de Contas da União) e aos conselheiros dos Tribunais de Contas estaduais e municipais (TCEs e TCMs) os mesmos direitos e garantias destinados, respectivamente, aos ministros do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e aos desembargadores dos TJs (Tribunais de Justiça). 

Essa simetria funcional ainda não se refletiu na composição da Corte superior de controle. Embora ao STJ ascendam, por comando constitucional, desembargadores estaduais e federais (um terço do Tribunal da Cidadania deve assim ser formado), não existe determinação normativa para o acesso de integrantes dos TCEs e dos TCMs ao TCU. A regra constitucional, todavia, se não impõe, também não impede que isso ocorra, o que, como decerto já percebido, é a proposta que aqui se constrói. 

Formado por 9 ministros, dos quais são exigidos rigorosos requisitos, como notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou de administração pública, o TCU recebe indicações do Congresso Nacional (dois terços) e do presidente da República (um terço).  As únicas escolhas vinculadas (duas das 3 sob incumbência do chefe do Poder Executivo) são as de um auditor e de um integrante do Ministério Público de Contas. 

As demais, portanto, desde que os escolhidos atendam comprovadamente aos requisitos constitucionais, são livres, nada obstando que recaiam, portanto, também sobre conselheiros dos outros Tribunais de Contas.

Duas promissoras notícias fazem eco à defesa aqui exposta. 

Uma, relativa à fiscalização concorrente entre órgãos de controle quando gastos públicos envolvem recursos de diferentes esferas de governo, indicando que está sendo implantado um projeto-piloto do TCU, do TCE/RN e do TCE/RS para atuação conjunta nessa sistemática (tudo a partir de inovador e republicano acordo de cooperação firmado em 2023 entre o TCU e a Atricon [Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil], ao qual já aderiram 23 TCs). 

A outra nota de destaque é a recente contribuição do TCU na solução consensual de controvérsias, cuja normativa já conta com pronunciamento favorável da Procuradoria Geral da República e da Advocacia Geral da União na ação que tramita a respeito no Supremo Tribunal Federal, forma essa de atuação também presente em outros TCs brasileiros. 

Um exemplo concreto a respeito vem com o instrumento por meio do qual os governos da Bahia e de Mato Grosso assinaram a primeira mediação técnica interfederativa, resolvendo conflitos de uma década. Com isso, foram preservados investimentos públicos em trens metropolitanos que corriam o risco de sucateamento, obsolescência ou perda. 

A vocação do TCU como um sustentáculo do princípio federativo na função de controle fica então ainda mais evidenciada, assim como a conveniência de que os demais entes nele se façam presentes, agregando a vivência das realidades locais à instituição superior de controle. Mas enquanto as normas não consolidam esse ideal, espera-se que os fatos caminhem nesse sentido, configurando uma sinergia em tudo favorável ao interesse público. E o Congresso tem a competência e a possibilidade de fazê-lo, considerando a experiência e o conhecimento dos integrantes dos demais 32 Tribunais de Contas do país na composição do TCU.

Fonte: Poder 360

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