O presidente russo, Vladimir Putin, afirmou, nesta quinta-feira (21), que o conflito na Ucrânia já tem aspecto de guerra “mundial” e declarou que não descarta atingir as potências ocidentais que forneceram a Kiev as armas usadas para atacar o território russo.
Estas ameaças ocorrem após um dia de forte tensão, durante o qual a Rússia disparou contra o território ucraniano um míssil de médio alcance e de última geração, projetado para transportar uma ogiva nuclear, mas que levava explosivos convencionais.
O presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, considerou este disparo um ato de um “vizinho enlouquecido”, que usa a Ucrânia como “campo de prova” militar.
Pouco antes, Kiev acusou Moscou de ter atacado Dinpro, cidade no centro-leste da Ucrânia, com um míssil com “todas” as características de um míssil intercontinental, algo inédito e uma escalada sem precedentes na guerra e nas tensões entre Rússia e Ocidente.
Em um curto discurso transmitido pela TV, Putin confirmou que, em resposta aos bombardeios com mísseis ocidentais contra seu território, a Rússia disparou contra a Ucrânia, nesta quinta, um novo tipo de míssil balístico hipersônico chamado “Oreshnik“, em sua “configuração desnuclearizada”.
O ataque teve como alvo “um local do complexo militar-industrial ucraniano”, afirmou.
Zelensky lamentou nas redes sociais que, até o momento, a comunidade internacional não teve “uma reação contundente” ao disparo russo.
“Precisamos reagir. Precisamos pressionar. Precisamos empurrar a Rússia até uma paz real, que só é possível mediante a força”, acrescentou.
O porta-voz do Kremlin, Dimitri Peskov, garantiu que a Rússia avisou os Estados Unidos com 30 minutos de antecedência sobre sua intenção de disparar um míssil hipersônico.
A Rússia está “pronta”
Em seu discurso de menos de dez minutos, Putin denunciou dois bombardeios ucranianos recentes contra o território russo com mísseis americanos ATACMS e britânicos Storm Shadow.
No domingo, os Estados Unidos autorizaram à Ucrânia usar estas armas para atacar o território russo, apesar das advertências da Rússia, que acenou com uma ameaça nuclear.
“Desde o momento [em que foram disparados estes mísseis contra a Rússia], e como tínhamos informado [de antemão] em reiteradas ocasiões, o conflito provocado pelo Ocidente na Ucrânia adquiriu elementos de caráter mundial”, declarou o líder russo com um tom firme.
“Nós consideramos que temos o direito de usar nossas armas contra instalações militares daqueles países que permitem usar suas armas contra nossas instalações”, advertiu Putin.
A porta-voz da Casa Branca, Karine Jean-Pierre, acusou Moscou de usar uma retórica “irresponsável” e garantiu que “a escalada a cada passo vem da Rússia”.
Além dos mísseis americanos ATACMS, os ucranianos dispõem de mísseis de cruzeiro franco-britânicos Storm Shadow/Scalp, fornecidos pelos dois países. A Alemanha, à qual a Ucrânia pede há tempos que lhe forneça seus próprios mísseis de cruzeiro Taurus, se recusou a fazê-lo categoricamente.
Em plena escalada do conflito, Putin declarou, ainda, que a Rússia está preparada para qualquer cenário, tanto perante a Ucrânia quanto frente ao Ocidente.
Os mísseis ATACMS têm um alcance de 300 km e os Storm Shadow/Scalp, de mais de 250 km, enquanto os mísseis de médio alcance, como o disparado pela Rússia, podem atingir alvos a 5.500 km.
Soldados norte-coreanos
Antes mesmo de Putin confirmar o disparo, a União Europeia e o Reino Unido ressaltaram que se trataria de uma “escalada” por parte de Moscou.
Contudo, a porta-voz da Otan, Farah Dakhlallah, indicou que “o uso dessa capacidade não mudará o rumo do conflito nem dissuadirá os aliados da Otan a apoiar a Ucrânia”.
Kiev há muito tempo reivindicava autorização para atacar com essas armas as bases de onde a Rússia bombardeia a Ucrânia. No entanto, seus aliados negavam a permissão, temendo a reação de Moscou, que considerava isso uma linha vermelha.
Segundo meios de comunicação ocidentais, os Estados Unidos e o Reino Unido finalmente deram luz verde, em resposta ao envio de milhares de soldados norte-coreanos para apoiar as tropas russas.
Moscou deve “reconsiderar” sua postura sobre o envolvimento “escalatório” de soldados norte-coreanos no conflito, declarou o ministro francês das Forças Armadas, Sébastien Lecornu.
Os danos causados pelo míssil russo em Dnipro não estavam claros de imediato. Duas pessoas ficaram feridas na região devido a bombardeios russos na quinta-feira, segundo o governador regional Sergii Lisak.
Advertência nuclear
O ataque ocorreu em um momento de tensão máxima entre Moscou e o Ocidente, às vésperas da volta de Donald Trump à Casa Branca, em janeiro, o que se prevê como um ponto de inflexão.
A Rússia, que invadiu a Ucrânia há quase três anos, intensificou nos últimos dias seus ataques em larga escala na Ucrânia e suas advertências contra os aliados de Kiev.
Esta semana, Moscou atualizou sua doutrina nuclear, que agora lhe permite usar armas nucleares contra países que não possuem este tipo de armamento, mas que são apoiados por uma potência nuclear, em uma alusão clara à Ucrânia e aos Estados Unidos.
No restante da Ucrânia, 26 pessoas ficaram feridas em ataques em Kryvyi Rih, cidade localizada cerca de 100 km a sudoeste de Dnipro, segundo o governador Lisak.
No leste do país, o exército russo segue avançando e o Ministério da Defesa reivindicou a ocupação de uma pequena localidade próxima à cidade de Kurakhove.
Os avanços russos preocupam especialmente Kiev, que teme ser forçada a se sentar à mesa de negociações em uma posição desfavorável.