Ex-presidente da autoridade monetária avalia que a falta de apoio fiscal para a política de juros será a principal dificuldade do futuro chefe da instituição
O ex-presidente do BC (Banco Central) Armínio Fraga disse nesta 5ª feira (29.ago.2024) que o indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para a assumir o posto, o atual diretor de Política Monetária da autoridade monetária, Gabriel Galípolo, pode ter que iniciar sua gestão aumentando a taxa básica de juros, que hoje está em 10,5% ao ano.
“A pressão é alta, porque não só as expectativas do [Boletim] Focus, como as taxas implícitas na curva de juros também apontam para níveis bem complicados. Ele vai começar numa situação bastante apertada”, disse o economista em entrevista ao Globo.
Na 4ª feira (28.ago), o presidente Lula indicou Galípolo, de 42 anos, para a presidência do BC. O anúncio foi feito pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, no Palácio do Planalto. O nome precisa ser aprovado pelo Senado.
Galípolo substituirá Roberto Campos Neto, que está no comando do BC desde fevereiro de 2019. Indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), Campos Neto colecionou críticas do governo Lula, principalmente por reduzir pouco, na avaliação do Executivo, a taxa básica de juros.
“Acho que ele [Galípolo] é uma pessoa da confiança do presidente [Lula]. Ele não estaria nomeando se não fosse. Não quer dizer que ele possa impunemente descumprir a lei e deixar a inflação acima da meta ou, até pior, afrouxar e deixar a inflação subir mais”, disse Fraga.
“Hoje, os números implícitos na curva de juros são bastante elevados. Para prazos superiores a 2 ou 3 anos, estão acima de 5%. Tem um prêmio de risco, sim, mas não é bom que esse prêmio de risco aumente muito. É um quadro difícil”, declarou o ex-chefe da autoridade monetária.
Na avaliação de Fraga, o desequilíbrio fiscal é o maior problema da economia brasileira e boa parte do desafio de Galípolo à frente da instituição “vem da falta de apoio fiscal” para a política de juros.
Ainda conforme o ex-BC, o arcabouço monetário-fiscal, com o tripé da política econômica formado pela meta de inflação, meta de superavit primário nas contas públicas e pelo câmbio flutuante, “tem se mostrado bastante positivo para o país, mas a perna fiscal está fragilizada, e isso produz uma sobrecarga no BC. Então, ele [Galípolo] vai entrar carregando um peso que deveria estar dividido com o lado fiscal”.
Atacar o crescimento do gasto, impor um Orçamento rígido e ajustar as regras do Imposto de Renda poderiam “dar condições de melhorar muito a qualidade da política macroeconômica”, segundo Fraga, facilitando a vida de Galípolo.
“É um fiscal ainda frouxo, forçando um monetário mais apertado. E é sempre bom frisar que o desafio vai além do macroeconômico. O desafio é incorporar uma redefinição de prioridades”, disse. Como exemplo, citou possíveis reajustes nos gastos do SUS (Sistema Único da Saúde), que, de acordo com o economista, “tem espaço para melhorar”.
“Sou conservador do lado fiscal, porque acho que o que temos [de gastos do Estado] não nos serviu bem no sentido mais amplo, incluindo a falta de prioridades, mas, hoje, não tenho dúvidas de que essa área é carente de recursos. É um absurdo chegar ao ponto de querer cortar o gasto de saúde no Brasil. É de matar, literalmente”, afirmou.
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