ABDI cria métricas para avaliar plano industrial de Alckmin

Agência, liderada por Ricardo Cappelli, também está fazendo parcerias com agências reguladoras para simplificar processos de liberação de empreendimentos

A ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial) está preparando um conjunto de métricas para medir a eficácia das medidas do NIB (Nova Indústria Brasil). O programa foi lançado em janeiro pelo vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e vai ganhar uma atualização em agosto.

Na ABDI, estamos colhendo dados da Finep, da Embrapii e do BNDES, os financiadores. Estamos integrando os números para começar a fazer uma avaliação sobre o impacto do crédito na economia brasileira. Com isso, vamos conseguir avaliar se gerou adensamento das cadeias produtivas, se está chegando nos setores estratégicos e quanto gerou de investimento privado“, disse ao Poder360 o presidente da agência, Ricardo Cappelli.

Assista à entrevista com Cappelli (29m22s):

As medidas devem ser apresentadas em agosto. Vão começar pelas linhas de crédito de R$ 300 bilhões para o setor.

Cappelli disse que está negociando aportes do Banco do Nordeste no NIB. Segundo ele, o presidente da entidade, Paulo Câmara, já concordou em colocar “algumas dezenas de bilhões”. O foco será nas micro e pequenas empresas. O anúncio também deve ser feito em agosto.

Outro foco de atuação da agência é em simplificar os processos regulatórios. Já firmou parceria com a ANM (Agência Nacional de Mineração) e está para concluir a negociação com a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e com o Ibama. Com isso, pretende liberar mais de R$ 400 bilhões em investimentos privados.

“O Ibama tinha 6.000 servidores. Hoje, 2.000. É muito pouco. São 73 sistemas operando internamente e nenhum se conversa. Não temos espaço fiscal para contratar 4.000, mas podemos agir com inteligência. Vamos reestruturar e integrar os sistemas e acoplar inteligência artificial na análise dos processos. Não vai substituir o técnico, mas fazer o trabalho burocrático”, disse, citando as licenças ambientais.

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Cappelli disse que a BDI vai implantar inteligência artificial nos sistemas das agências reguladoras do Brasil

Cappelli fez coro ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e criticou a taxa de juros no país. Segundo ele, o debate sobre corte de gastos tem necessariamente que passar pela redução dos juros.

O Brasil vai pagar esse ano R$ 760 bilhões em serviço da dívida. A cada ponto dos juros que cai, a gente economiza mais de R$ 70 bilhões. Por que não baixar?“, disse.

Leia trechos da entrevista:

Poder360 – A ABDI está criando critérios de acompanhamento do NIB. Como será feito?
Ricardo Cappelli – A NIB é uma política bastante ampla. Envolve um conjunto de iniciativas, como o P+P (Plano + Produção), que dispõe de cerca de R$ 300 bilhões no BNDES, na Finep e Embrapii. Estive recentemente no Banco do Nordeste com o presidente Paulo Câmara. O banco também está se integrando ao esforço.

Qual será a contribuição do Banco do Nordeste no NIB?
Eles estão formulando a entrada no processo. Mas será na casa das dezenas de bilhões, focados em micro, pequeno e médio.

E o restante do plano?
O P+P oferece juros de mercado. Para inovação, são menores. Há um conjunto de iniciativas como o Mover, com investimento de R$ 19,8 bilhões em P&D (Pesquisa e Desenvolvimento) na indústria automotiva até 2028 visando a transição energética. A Anfavea, como resultado, anunciou investimentos de R$ 130 bilhões. Tem a depreciação acelerada, com mais de R$ 3,8 bilhões para renovação de maquinário. A média de idade das máquinas industriais brasileiras é de 14 anos. Com a tecnologia, o parque está se renovando rapidamente, modernizando a indústria e trazendo mais produtividade. Também mobiliza a indústria de máquinas e equipamentos nacionais. E fizemos ajustes em políticas tarifárias de importação, como o aço.

Que passou de 9% para 25%.
Foi um ajuste bem preciso feito em diálogo com a indústria para não ter efeito negativo na cadeia que depende do aço. Fez como que a indústria siderúrgica anunciasse um investimento de R$ 128 bilhões na ampliação do parque industrial. E também temos a criação da LCD (Letra de Crédito de Desenvolvimento), que é uma versão para a indústria da LCI (Letra de Crédito Imobiliário) e da LCA (Letra de Crédito Agrícola). São mais R$ 10 bilhões.

E as pequenas e médias empresas?
Há também o B+P (Brasil + Produtivo), que são recursos para 200 mil micro, pequenas e médias empresas. São 93.000 consultorias presenciais com foco na digitalização e no aumento da produtividade junto do Senai e do Sebrae.

E qual o papel da ABDI nesse processo?
O MDIC vai estabelecer em agosto novas metas para o NIB. Na ABDI, estamos colhendo dados da Finep, da Embrapii e do BNDES, os financiadores. Estamos integrando os números para começar a fazer uma avaliação sobre o impacto do crédito na economia brasileira. Com isso, vamos conseguir avaliar se gerou adensamento das cadeias produtivas, se está chegando nos setores estratégicos. Responder quais setores não estão buscando financiamento e entender o motivo. Estamos construindo essa análise de inteligência. Começamos pelo P+P, de R$ 300 bilhões. Depois colocaremos as outras políticas. Esse monitoramento serve para validar se a política está correta e gerando resultados.

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Para Cappelli, a nova política industrial deve ajudar a promover o investimento privado no país

Não é algo comum no Brasil.
Não. Precisamos medir resultados. Um relatório de janeiro do FMI traz dados do observatório da indústria deles. Eles detectaram só no ano passado 2.500 novas políticas industriais no mundo e 48% delas na China, EUA e UE com impacto em 71% do comércio global a partir de 3 vetores centrais.

Quais?
A primeira é que a pandemia deixou claro que há gaps na cadeia de suprimentos, dependências muito grandes de alguns países. Há uma busca por equilíbrio. A segunda é a necessidade da transição energética. Veja o que aconteceu no Rio Grande do Sul. É inaceitável que continuemos a jogar gases poluentes na atmosfera subindo a temperatura e gerando eventos climáticos extremos. O terceiro são as tensões geopolíticas crescentes. Vemos a guerra na Ucrânia e o impacto na indústria europeia, especialmente na Alemanha, com a Rússia fechando o gás em reação às sanções. A política industrial é agressiva. No Brasil, falamos em crédito de R$ 300 bilhões. Os Estados Unidos estão colocando US$ 1,9 trilhão, a União Europeia US$ 1,7 trilhão e o Japão US$ 1,5 trilhão. Boa parte é recurso a fundo perdido. Um exemplo: a nova fábrica da Intel vai custar US$ 100 bilhões. O governo norte-americano vai colocar US$ 30 bilhões a fundo perdido. É uma reorganização e uma disputa por novas plantas.

Mas o Brasil está investindo bem menos. Há espaço fiscal para ampliar?
No monitoramento [da ABDI] estamos procurando quantificar por 2 aspectos: pelo impacto direto e pela geração de investimento privado como resultado. Um país com as condições do Brasil não consegue dar um salto de desenvolvimento só com o orçamento público. Para isso, é fundamental o privado. Há questões centrais para esse estímulo. Agora, precisamos superar eventuais gargalos regulatórios. Por exemplo: só a Vale tem investimentos de R$ 350 bilhões aguardando análise de 77 licenças no Ibama. A ANM (Agência Nacional da Mineração) tem 215 mil processos na fila, sendo 21.000 de pedidos de pesquisa e lavra. Há um gargalo regulatório e precisamos acelerar esses processos.

Como fazer isso?
Assinamos acordo de cooperação técnica com a ANM e vamos assinar com Ibama e Anvisa. O Ibama tinha 6.000 servidores. Hoje, 2.000. É muito pouco. São 73 sistemas operando internamente e nenhum se conversa. Não temos espaço fiscal para contratar 4.000, mas podemos agir com inteligência. Vamos reestruturar e integrar os sistemas e acoplar inteligência artificial na análise dos processos. Não vai substituir o técnico, mas fazer o trabalho burocrático. Questões que levam horas, podem levar minutos ou segundos com inteligência artificial. Faremos também a modelagem e o fluxo dos processos. E precisamos de uma reavaliação normativa. Só no governo federal temos 136 órgãos ou comissões reguladoras que emitem uma média de 900 novas normas por dia. É impossível desenvolver a indústria com um hospício regulatório desses.

Qual o custo dessas parcerias?
Essa parte não depende muito de dinheiro. É operacional, gestão. Claro que tem algum dinheiro para contratar software, por exemplo. Mas a grande questão é a decisão política, que foi tomada. Mas aí entra uma outra questão que é fundamental de ser debatida.

Qual?
Juros. Não há justificativa técnica para o patamar atual [de 10,5%]. O Brasil tem a 2ª maior taxa de juros do planeta. São 6% de juros reais. Tem países do mundo com juros negativos. O Brasil tem inflação na meta, menor desemprego em 12 anos, US$ 350 bilhões de reserva que nos protege contra choques externos. Temos o deficit, mas me diga qual país no mundo está trabalhando com deficit zero ou superavit neste momento? Eu vejo muita gente dizendo que precisa fazer ajuste fiscal. Todo mundo defende ajuste. O presidente Lula tem dito que aprendeu com a dona Lindu (sua mãe) que não pode gastar mais do que ganha.

Mas em entrevista recente ele disse que não estava convencido que era necessário cortar.
A questão aí é cortar o quê? De onde? Tem que fazer o debate com a sociedade. Ouvi nas últimas semanas gente defendendo desindexar recursos do BPC do salário mínimo, que foca em aposentados e pessoas com deficiência. Justifica? Temos R$ 650 bilhões em desoneração para grandes setores. Vamos reduzir isso? O Brasil vai pagar esse ano R$ 760 bilhões em serviço da dívida. A cada ponto dos juros que cai, a gente economiza mais de R$ 70 bilhões. Por que não baixar?

Mas há áreas que gastam muito ou gastam mal. Tem de onde cortar.
O ministro Fernando Haddad (Fazenda) tem se esforçado para ampliar a eficiência da máquina pública. A questão central é a qualidade do gasto, não a quantidade. Gasto público que gera desenvolvimento volta como receita para o Estado. O problema é o desperdício. O esforço agora é para cortar o desperdício. Para gerar desenvolvimento, é fundamental debater a disfuncionalidade do sistema financeiro. Nos Estados Unidos, há 4.000 bancos. Nenhum país do mundo pratica o spread do Brasil. Temos um oligopólio de 5, 6 bancos, que controla o mercado de capitais no Brasil. É um veneno para a economia. No Brasil se institucionalizou a agiotagem. Não há como pensar na indústria quando se dá mais dinheiro ao mercado financeiro. Entre 2011 e 2020, o Brasil cresceu 0,6% anual em média. É a maior tragédia. Na década de 80, a década perdida, foi de 1,6%. Compare com o resultado dos bancos. Ganharam os tubos.

Mudando de assunto, o senhor foi interventor na segurança do Distrito Federal depois do 8 de janeiro. Seu objetivo foi realizado?
Recebi um avião em uma pane grave, lotado e caindo. O meu objetivo era estabilizar o avião, colocar em solo suavemente e com todo mundo vivo. Foi o que fizemos em 23 dias conjugando firmeza e equilíbrio.

Fonte: Poder 360

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