Banco diz que ex-diretor financeiro Alexsandro Broedel agiu em benefício próprio ao aprovar pagamentos de R$ 10,5 milhões; ele é o 2º alto executivo do Itaú em poucos dias que foi exposto em público por mau comportamento, depois da demissão do CMO Eduardo Tracanella
O Itaú Unibanco publicou uma ata de uma assembleia-geral extraordinária (PDF – 71 kB), de 5 de dezembro de 2024, na qual acusa seu ex-diretor financeiro Alexsandro Broedel de ter agido “em violação às políticas internas e à legislação e à regulamentação aplicável”, além de ter atuado “em grave conflito de interesses, e em benefício próprio, no relacionamento com determinado e específico fornecedor de pareceres”.
Na função de chief financial officer (diretor financeiro) do Itaú, segundo o banco, Broedel usou “de forma irregular, das alçadas e prerrogativas do seu cargo, aprovou pagamentos a referido fornecedor no valor histórico total de R$ 10,455 milhões”. Foram R$ 3,380 milhões (em 2021), R$ 1,850 milhão (2022), R$ 3,350 milhões (2023) e R$ 1,875 milhão (2024).
O Itaú informa na ata de sua assembleia extraordinária que os resultados da apuração interna “foram comunicados tempestivamente ao Banco Central do Brasil, e aos Auditores Independentes da Companhia (Pricewaterhouse-Coopers)”.
Eis a imagem da ata de 5 de dezembro de 2024 do Itaú, que foi publicada em formato de anúncio no jornal O Estado de S.Paulo deste sábado (7.dez.2024):
Esta foi a 2ª exposição pública de ex-diretores do alto escalão do Itaú em poucos dias. Em 29 de novembro de 2024, numa reunião para dezenas de gestores, o banco comunicou a todos que havia demitido seu CMO (chief marketing officer) Eduardo Tracanella por mau uso do cartão corporativo em despesas pessoais.
Tracanella trabalhou 27 anos no Itaú e era o responsável pelo uso de aproximadamente R$ 2 bilhões por ano em ações de marketing e publicidade, inclusive em campanhas milionárias para festejar os 100 anos da instituição, com a contratação de personalidades internacionais como a cantora Madona e o piloto de F1 Lewis Hamilton. A atuação de Tracanella já era vista com ressalvas há algum tempo por fazer pouca propaganda sobre produtos do banco e por decisões consideradas equivocadas ao alocar orçamento para veículos de baixo impacto, como algumas TVs de notícias a cabo com quase zero de audiência.
No caso de Alexsandro Broedel, que trabalhou 12 anos no Itaú e no passado havia sido diretor da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), as apurações foram presididas pelo Comitê de Auditoria do banco. A ata em que a decisão é relatada informou que seria ajuizado em 6 de dezembro de 2024 um “protesto interruptivo de prescrição, medida preparatória a fim de preservar e resguardar os direitos” da instituição. Como consequência, ficou determinado que “sejam tomadas todas as medidas legais cabíveis contra o ex-administrador, o fornecedor [cujo nome não foi revelado] e todos os demais que concorreram para os fatos apurados, perante todos os órgãos e instâncias competentes, nas esferas administrativa e judicial”.
Alexsandro Broedel já estava fora do Itaú desde 5 de julho de 2024. Segundo o site de notícias Neofeed, em reportagem publicada em 8 de julho de 2024, ele já teria sido imediatamente contratado pelo banco Santander para “comandar a unidade global de contabilidade do banco espanhol” como chief accounting officer. Broedel assumiria o post só no início de 2025 e não há ainda informação se essa decisão está mantida agora com acusações públicas do Itaú contra seu ex-executivo.
Embora na ata da assembleia não cite o nome do fornecedor do banco que teria sido beneficiado pelas ações de Alexsandro Broedel, isso fica explicitado na ação ajuizada na 6ª feira (6.dez.2024) na Justiça de São Paulo. O processo é contra Broedel e informa que ele “prestava serviços de parecerista e consultor ao mercado” enquanto atuava ao mesmo tempo como CFO do Itaú. Eis a íntegra (PDF – 311 kB).
A ação afirma que seu ex-executivo tinha uma empresa em sociedade com o consultor Eliseu Martins, a Broedel Consultores. O ex-CFO do Itaú tinha 80% das ações.
Martins e Broedel estão sendo processados na mesma ação. Na função de diretor do Itaú, Broedel contratava a Care, outra empresa de consultoria de Martins, e assim prestava serviços para o banco. A cobrança era feita pela Care, que por sua vez repassava 40% do valor recebido para outra empresa, chamada Evam (de propriedade Martins e de seus filhos). Por fim, segundo o esquema descrito, A Evam fazia pagamentos para Broedel, tanto para ele como pessoa física quanto na pessoa jurídica.
Na ação, o Itaú argumenta que Alexsandro Broedel recebeu cerca de R$ 4,8 milhões nos últimos 5 anos por conta do esquema narrado. Eis um trecho do processo:
“De junho de 2019 a junho de 2024, Broedel contratou 40 pareceres junto à Care (sociedade cujos sócios são Eliseu Martins e seu filho, Eric Martins). Por conta de tais contratações, foram realizados pelo Itaú 21 pagamentos, que somam o valor de R$13,2 milhões […] Todos os pagamentos foram aprovados por Broedel junto aos sistemas mantidos pelo Itaú, utilizando-se das alçadas do seu cargo”.
OUTROS LADOS
Eis o que disse Alexsandro Broedel por meio de sua assessoria de imprensa:
“Sobre acusações infundadas e sem sentido feitas pelo Itaú a Alexsandro Broedel, informamos que Alexsandro Broedel sempre se conduziu de forma ética e transparente em todas as atividades ao longo dos seus 12 anos no banco – algo nunca contestado pelo Itaú, que tem uma rigorosa e abrangente estrutura de controle e compliance, própria de um grupo financeiro com seu porte e importância na economia brasileira. O parecerista mencionado pelo Itaú já prestava serviços ao banco há décadas, muito antes de Broedel ser convidado para a diretoria da instituição. Os serviços mencionados eram do conhecimento do Itaú e requeridos por diferentes áreas do banco. Causa profunda estranheza que o Itaú levante a suspeita sobre supostas condutas impróprias somente depois de Broedel ter apresentado a renúncia aos seus cargos no banco para assumir uma posição global em um dos seus principais concorrentes, cumprindo o período de quarentena definido pelo banco. Alexsandro Broedel tomará as medidas judiciais cabíveis neste caso”.
No caso do Itaú, o jornal O Globo recebeu esta nota a respeito caso:
“O Itaú Unibanco esclarece que, após meses de apurações internas, identificou que seu ex-administrador Alexsandro Broedel Lopes violou gravemente o Código de Ética da instituição, ao exercer atividade externa incompatível com seu cargo, e manter sociedade com fornecedor técnico-contábil do banco, não declaradas aos controles internos, que se renovam anualmente.
“Broedel Lopes ainda atuou em grave conflito de interesses, transgredindo as regras internas e as leis aplicáveis, usando irregularmente as alçadas do seu cargo, e nos últimos cinco anos, aprovou contratações de pareceres e pagamentos no valor total de R$ 13.255.000,00 –sendo 10.455.000,00 entre 2022 e 2024–, para empresa ligada ao fornecedor do qual era sócio. Foram apurados, ainda, fortes indícios de que o fornecedor redirecionava parte do recebível diretamente para contas de Alexsandro Broedel Lopes, em 23 transferências, realizadas no período de 2019 a 2024, no valor total de R$ 4.860.000,00, primordialmente para contas em outras instituições, usando empresa intermediária. O banco reforça que se trata de uma situação isolada e que não há prejuízo relevante à instituição, que está limitado aos valores acima.
“Inclusive, não foi identificada nenhuma preocupação com relação aos pareceres recebidos. Ressalta-se, ainda, que seus balanços foram reavaliados pelo Comitê de Auditoria da Companhia e por consultoria externa e independente, a PWC, que certificaram a lisura e a ausência de impacto nas demonstrações financeiras e nos resultados do Itaú Unibanco. O Itaú reafirma que seu robusto ecossistema de políticas e processos de ética e conformidade permanecem íntegros e não houve falha interna neste sentido. Com a devida tempestividade e transparência, o Itaú reportou o caso a todos os órgãos reguladores competentes. Por fim, declara que está ajuizando as medidas adequadas contra Broedel Lopes e o fornecedor para buscar o ressarcimento dos valores. Ética é um valor inegociável do Itaú Unibanco, por isso, não toleramos e não toleraremos qualquer desvio de conduta, de qualquer hierarquia, e buscaremos reparação, mesmo em casos como este, em que o envolvido não faz mais parte dos nossos quadros”.