Luiz Felipe Attié afirma que a declaração do presidente sobre o tema foi mais uma “pressão” para que as bets sigam a lei; Pietro Lorenzoni avalia que a fala integra debate público
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse mais de uma vez que acabará com as apostas on-line caso a regulamentação não dê “resultado”. A declaração do petista é vista mais como uma forma de fazer com que as bets sigam as normas, na visão de especialistas consultados pelo Poder360.
Advogado da área de Meios de Pagamento do escritório BTLAW (Barcellos Tucunduva Advogados) e especialista em direito empresarial pela FGV, Luiz Felipe Attié diz que a fala de Lula não é técnica. “É uma declaração mais no sentido de fazer uma pressão para que as atuais empresas de apostas cumpram com a regulamentação do que uma fala técnica, uma vez que a própria regulamentação surgiu em seu governo e que ele não tem como simplesmente acabar com as apostas. Não cabe ao presidente simplesmente acabar com isso”, declara a este jornal digital.
Em 6 de outubro, o presidente ameaçou “acabar” com as apostas no Brasil caso a regulamentação das bets não funcionasse. Disse não ter a intenção, mas que tomaria essa atitude caso a regulamentação das casas de apostas não desse resultado.
Em 17 de outubro, o chefe do Executivo voltou a dizer que acabará com o setor “se a regulação não der conta”.
O advogado Pietro Lorenzoni é professor de processo constitucional no IDP (Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa) e especialista em direito público com foco no direito constitucional, regulatório e administrativo. Na sua visão, a declaração de Lula “faz sentido” dentro de um contexto e do debate público.
“A melhor praxe internacional demonstra que a solução para todos os malefícios desse setor é a legalização e a regulamentação, porque com isso se terá controle, fiscalização, monitoramento, transparência, supervisão estatal com criação de trabalhos e recolhimento de impostos”, afirma.
Na sua avaliação, não há atraso do governo quanto à regulamentação. “O que teve é o prazo natural de desenvolvimento desses trabalhos, de uma tarefa extremamente complexa, que é a regulamentação de um setor sensível, como esse setor de apostas esportivas e apostas em jogo on-line”, diz.
DINHEIRO EM BETS ILEGAIS
Em 11 de outubro, a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) começou a derrubar os sites que não estão autorizados pelo Ministério da Fazenda. O ministro Fernando Haddad disse ainda que não há “alternativa tecnológica” para restituir esses valores de quem não os resgatou 10 de outubro.
“Nesse momento, nós não temos como acionar uma empresa que pode estar fora do Brasil para restituir o dinheiro”, disse.
Para Attié, o governo Lula “não tinha nenhum plano” para devolver esse saldo aos apostadores. “O atual governo na verdade pensou muito em retirar do ar os sites que não entraram com pedido de autorização, não possuíam autorização, mas não pensou que os apostadores precisavam retirar esse saldo […] É direito do apostador ter acesso a esse saldo que tinha nos sites que foram tirados do ar”, declara.
FAZENDA X LOTERJ
Em 11 de outubro, a AGU (Advocacia Geral da União) entrou com uma ação no STF (Supremo Tribunal Federal) para proibir que casas de aposta autorizadas pela Loterj (Loteria do Estado do Rio de Janeiro) atuem em todo o país. O governo diz, em nota, que essa atuação em âmbito nacional desobedece regras do Ministério da Fazenda e invade a competência da União. Eis a íntegra (PDF – 8 MB).
A Loterj, por sua vez, contestou a ação da AGU. A autarquia fluminense afirmou que suas atividades no setor de apostas do Rio de Janeiro são legais e pediu que o STF rejeite o pedido do governo para suspender a atuação nacional de bets credenciadas pelo órgão. Eis a íntegra da impugnação preliminar (PDF – 658 kB).
Lorenzoni diz que a tendência é o STF estabelecer limites na atuação da Loterj: “A resposta final é do Supremo sobre esse caso e, sem dúvida nenhuma, em que pese a melhor prática internacional, limite essa exploração pelos Estados de forma que veicule de forma nacional apenas a licença federal.”
Luiz Felipe Attié reforça que os Estados e o Distrito Federal “não podem explorar essa atividade para apostadores que não estão em sua jurisdição”.
O advogado afirma que a discussão versa sobre o “território em que esses apostadores se encontram” e que o tema será resolvido com a atribuição de “dispositivos mais precisos e métodos mais eficientes para que as loterias consigam identificar a localização de cada apostador e evitar que essa modalidade estadual seja explorada a nível nacional, coisa que não é permitida pela lei”.