Montante começou a ser liberado depois 3 de dezembro, mas R$ 1,5 bi foi depois de “pedalada” para contornar decisão do STF
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pagou cerca de R$ 1,8 bilhão em emendas a senadores e a deputados desde a decisão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Flávio Dino, em 3 de dezembro, que liberou os recursos. A maior parte, aproximadamente R$ 1,5 bilhão, entretanto, foi repassada depois de uma portaria interministerial e de um parecer da AGU (Advocacia Geral da União) com uma “pedalada jurídica” que contorna trechos do que a Corte validou por 11 a zero.
Segundo a SRI (Secretaria de Relações Institucionais), chefiada pelo ministro Alexandre Padilha, foram pagos nesse período R$ 1,761 bilhão em emendas:
- emendas individuais (RP6): R$ 228,6 milhões;
- emendas de bancada (RP7): R$ 300,4 milhões;
- emendas Pix (transferências especiais): R$ 1,232 bilhão.
O esperado era que a portaria e o parecer da AGU permitissem a liberação de R$ 6,4 bilhões em emendas a deputados e senadores ainda em dezembro de 2024.
O texto é uma forma de contornar a decisão unânime do Supremo Tribunal Federal, determinando que as regras para liberação de dinheiro de emendas ao Orçamento sejam mais transparentes (com o nome de cada deputado e senador que propõe o uso de verbas) e com planos de trabalho sobre como os recursos serão empregados.
A pedalada legal do Poder Executivo tem apoio do Congresso e passa por cima das decisões de Dino, relator do caso no Judiciário.
A seguir, um resumo do que fixa a portaria:
- Pix – o pagamento está liberado, mas os beneficiários têm até 31 de dezembro para apresentar os “planos de trabalho” de cada transferência, que será analisado até 1º de fevereiro de 2025;
- comissão – o pagamento está condicionado à identificação de quem pediu;
- área da saúde – emendas empenhadas até 3 de dezembro estão liberadas para pagamento, depois disso, precisarão passar por avaliação técnica do SUS.
O líder do Governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), disse na 4ª feira (11.dez) que, além da liberação dos R$ 6,4 bilhões em emendas de comissão e de bancada, o governo quer liberar cerca de R$ 7 bilhões em emendas Pix. Os valores somam quase R$ 14 bilhões.
O ministro da AGU, Jorge Messias, defendeu a portaria, dizendo que esta “simplesmente cumpre o que foi determinado pelo Supremo”.
Segundo Messias, o documento serve só para orientar gestores públicos quanto à execução das verbas –que vêm sendo alvo de decisões de Dino.
Messias afirmou que isso se fez necessário porque as determinações do ministro modificaram as regras para a execução desses recursos –ao determinar maior transparência aos repasses, por exemplo – e, portanto, o governo teria que explicar como deve ser seguida na prática.
JUDICIÁRIO X CONGRESSO
Dino bloqueou a liberação de dinheiro de emendas ao Orçamento em 14 de agosto. Há cerca de R$ 25 bilhões represados.
O ministro do STF determinou que o Congresso melhorasse as regras de controle dos recursos. Isso foi feito em uma lei que acabou aprovada em 19 de novembro pelo Poder Legislativo.
Dino liberou o pagamento, mas com ressalvas –e foi apoiado por todos os ministros da Corte. Os congressistas não gostaram.
O governo Lula, por meio da Advocacia Geral da União, pediu ao magistrado que reconsiderasse suas ressalvas, o que foi negado por completo na 2ª feira(9.dez).
Agora, a portaria publicada na edição extra do Diário Oficial da União dá uma pedalada em Dino e vai liberar dinheiro mesmo sem atender a todas as regras impostas pelo ministro.
Na prática, nada vai acontecer para impedir o ato do governo, exceto se alguém (um partido político, por exemplo) questionar o STF.
A liberação dos recursos é considerada crucial para que o Congresso aprove ainda neste ano parte do pacote de corte de gastos apresentado pela Fazenda.
O governo também quer que deputados e senadores votem até o Natal o Orçamento de 2025 e a regulamentação da reforma tributária. O prazo para que tudo isso ande no Legislativo é de apenas duas semanas, tempo muito exíguo para a dinâmica do Congresso.
A preocupação do governo com o mau humor do Congresso levou Lula a convocar uma reunião de última hora na 2ª feira (9.dez) com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), no Palácio do Planalto.