O ano de 2024 foi muito importante para Eddie Murphy, seu personagem mais famoso do cinema (o policial Axel Foley) e a franquia ‘Um Tira da Pesada’. Isso porque em 2024, ‘Um Tira da Pesada’ completa 40 anos de seu lançamento. Como comemoração, em parceria com a Netflix, ‘Um Tira da Pesada 4’ foi lançado no streaming no início de julho – e o resultado foi uma nova onda de popularidade para não apenas o primeiro filme, como suas duas continuações também. Todos os quatro longas do policial tagarela estão disponíveis na Netflix. Portanto, corra para conferir.
Nessa nova matéria, começaremos com a pergunta: o que ‘Um Tira da Pesada’ tem a ver com ‘Top Gun – Ases Indomáveis’? Bem, mais do que muitos podem imaginar. Vale começar dizendo que o primeiro foi o maior sucesso de 1984 nas bilheterias, e dois anos depois vimos o fenômeno se repetir com o segundo em 1986. Ah sim, ambos foram produzidos por Don Simpson e Jerry Bruckheimer, sob o escudo do estúdio Paramount. Dessa forma, nada mais justo do que para a primeira continuação de ‘Um Tira da Pesada’ fosse trazido o mesmo diretor de ‘Top Gun’, Tony Scott. Pena que ‘Top Gun’ não ganharia uma continuação nos anos 80, mas isso é assunto para outra matéria.
Era de se esperar que com o sucesso fenomenal de ‘Um Tira da Pesada’, que com o orçamento de US$13 milhões, conquistou uma bilheteria de US$234 milhões somente nos EUA, e US$316 milhões mundiais, uma sequência nas telonas estaria garantida. Mas a trajetória do policial Axel Foley não seria tão fácil assim. A começar que os produtores desejavam levar a franquia para as telinhas, com a ideia de uma continuação não nos cinemas e sim na TV na forma de uma série. Isso se deu pela performance abaixo do esperado de ‘O Rapto do Menino Dourado’ (1986), o filme com o qual Eddie Murphy seguiu o sucesso de ‘Um Tira da Pesada’, igualmente produzido pela Paramount.
Com um orçamento maior e sendo Eddie Murphy um astro consolidado, ‘O Rapto do Menino Dourado’ falhou em chegar perto do sucesso que foi ‘Um Tira da Pesada’. Assim, com as expectativas mais baixas, a ideia dos produtores era levar Axel Foley para a TV. Eddie Murphy por outro lado, mesmo com o primeiro baque, não pensava em voltar para as telinhas, e fechou acordo para retornar como Foley, mas em grande estilo nas telonas novamente.
A primeira grande diferença é que ‘Um Tira da Pesada 2’ marcaria um divisor de águas na carreira do astro Eddie Murphy, pois seria o primeiro filme que o ator assinaria o argumento, em parceria com Robert D. Wachs, com roteiro desenvolvido por Larry Ferguson e Warren Skareen, baseado nos personagens criados por Danilo Bach e Daniel Petrie Jr. – os roteiristas do original. Porém, antes de qualquer filme começar a ser gravado é preciso ter uma história (bem, na maioria dos casos). Assim era preciso decidir para onde levar Axel Foley a seguir.
Em um dos primeiros tratamentos do roteiro, escritos então por Bud Shrake e Dan Jenkins, Foley estaria disfarçado de detetive particular ajudando o trio formado pelos parceiros Taggart, Billy Rosewood e Bogomil a desbaratinar uma quadrilha de seguranças particulares corruptos comandado por um empresário criminoso de Detroit. Nessa história, Axel teria uma parceira mulher chamada Lucy, que terminaria sendo seu interesse amoroso no filme.
Outra ideia cogitada para a narrativa seria ainda mais ousada, e levaria Axel para fora dos EUA, onde ele se juntaria a detetives britânicos da Scotland Yard para resolver um caso. Nessa história existiam dois problemas: eliminar a participação do elenco original e perder o sentido do título “Beverly Hills Cop” – uma vez não estando mais em Beverly Hills. Porém, essa ideia voltaria à tona para o terceiro filme.
No fim das contas, a ideia foi por uma trama mais próxima do original. Aliás, não apenas isso, como o motivador seria o mesmo. No primeiro filme, Foley chega à Beverly Hills, Los Angeles, perseguindo o assassino de seu colega Mike Tandino (James Russo). Na continuação, ele também deixa seu trabalho na cidade de Detroit para se aventurar em um segundo round por Beverly Hills após o quase assassinato de seu colega, o Tenente Bogomil (Ronny Cox – que no mesmo ano seria o vilanesco Dick Jones de ‘Robocop’, outro clássico da época). Essa mesma dinâmica seria repetida também no terceiro ‘Um Tira da Pesada’ com o Inspetor Todd (Gill Hill).
A investigação em ‘Um Tira da Pesada 2’ gira em torno da chamada quadrilha do Alfabeto, um grupo de criminosos que deixa cartas com letras e códigos a cada roubo ou crime que realizam. Que, é claro, estaria ligada a um figurão de Beverly Hills, desta vez o empresário Maxwell Dent (Jürgen Prochnow), fazendo as vezes de Steven Berkoff e seu Victor Maitland do original. Assim, é claro que a turma toda precisava estar de volta também. Além de Bogomil (Cox), o ingênuo e boa-praça Billy Rosewood (Judge Reinhold – ao lado de Murphy, o único que permanece em todos os filmes da franquia); o ranzinza John Taggart (John Ashton); e o colega da polícia de Detroit (que nunca participa da ação) Jeffrey Friedman (Paul Reiser).
Apesar de o time estar quase todo reunido, duas ausências do original foram sentidas. A primeira é a colega de Foley, Jenny Summers, papel de Lisa Eilbacher, a protagonista feminina da trama. O segundo, que chegou a ser cogitado para uma aparição na sequência, é Serge, o marchand gay vivido por Bronson Pinchot, que roubou a cena no original. Embora tenha sido planejado para retornar, Pinchot não conseguiu agenda devido às gravações da série de sucesso que estrelava na época, ‘Primo Cruzado’ (Perfect Strangers, 1986-1993).
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Mas a maior e melhor adição feita ao elenco de ‘Um Tira da Pesada 2’ foi mesmo Brigitte Nielsen, estrela em ascensão na época. A loira de 1.85m (sua altura vira inclusive piada no filme) começou a carreira como modelo, mas nos anos 80 seria figura fácil em algumas produções famosas, em especial ‘Rocky IV’ (1985) e ‘Cobra’ (1986). Isso porque a dinamarquesa Nielsen se casou com Sylvester Stallone em 1985. Na época ela também protagonizou ‘Guerreiros de Fogo’, ao lado de Arnold Schwarzenegger. O casamento com Sly viria ao fim em 1987 e pode ter sido motivado pelo dito caso que ela teria tido com o diretor Tony Scott durante as gravações deste longa.
Seja como for, após a separação com Sly as portas não se abririam mais tão facilmente para Brigitte Nielsen, e ‘Um Tira da Pesada 2’ seria seu último grande filme de sucesso. No longa, ela interpreta Karla Fry, a líder da quadrilha do alfabeto, uma loira fria e mortal que atravessa o caminho dos protagonistas. De certa forma, tudo se conecta nos bastidores desta sequência. A começar que Stallone deveria ter sido o protagonista do primeiro ‘Um Tira da Pesada’. Após desistir do projeto, ele levou algumas de suas ideias para o filme ‘Cobra’ (no Brasil conhecido como ‘Stallone Cobra’, síntese do relacionamento do astro com Nielsen). A atriz aparece com a principal antagonista da sequência. E numa cena na casa de Billy Rosewood podemos notar tanto o poster de ‘Cobra’ quanto o de ‘Rambo 2’, ambos, é claro, estrelados por Sly.
Devido a uma participação maior de Eddie Murphy na produção do longa, ‘Um Tira da Pesada 2’ foi considerado na época uma “ego trip” do ator, e não recebeu críticas muito favoráveis. Nem mesmo os fãs gostaram tanto quanto do primeiro, o que é normal na maioria dos casos para continuações. Apesar disso, o filme não fez feio nas bilheterias, se tornando entre outras coisas a maior abertura de um filme no fim de semana de estreia (na época) com US$26 milhões, destronando o antigo campeão, ‘Indiana Jones e o Templo da Perdição’ (1984).
Em seu fim de semana de estreia, ‘Um Tira da Pesada 2’ não deu chance para ninguém, reinando absoluto no topo das bilheterias nos EUA, e assim permanecendo pelos próximos dois fins de semana – liderando no total por três semanas. Nem mesmo a estreia de ‘Os Intocáveis’, thriller de máfia de Brian De Palma, teve chance. O filme só viria a perder a liderança com a estreia de ‘O Predador’ e ‘As Bruxas de Eastwick’ no segundo fim de semana de junho de 1987. No fim das contas, com o orçamento de US$27 milhões, a sequência arrecadaria US$153 milhões nos EUA, e US$299 milhões ao todo no mundo – embora não atingindo o mesmo nível do original, ainda assim garantindo o sucesso. Mas seriam nada menos que sete anos para vermos Axel Foley novamente.